sexta-feira, 3 de agosto de 2012

CONTOS PERVERSOS

“Lendo alguns dos textos distraidamente começamos a imaginar a reserva ética, moral e psicológica da paróquia e de cada autor. São, absolutamente, contos perversos.”
Por Ventura Picasso*
Participando da vida em sua totalidade, através da literatura, por textos eróticos de amor e ódio, de prazer e dor, com fé no monoteísmo sexual na hora exata do orgasmo, de alegria e tristezas descobri em“Contos Perversos” a perfeição libertária provocada pelos “27 guerreiros, irrequietas almas, que se escondem” dividindo suas 178 páginas.
O prefácio, “Em Fermentação”, de Aninha Franco, seduz qualquer leitor que tenha um mínimo de conhecimento dos protagonistas que conviveram com Lou Salomé. Na página 15, nos traz um trecho de “Cartas a um Jovem Poeta”, de Rilke, sobre o interesse principal da missiva: ― Meus textos são bons?
Aqui a escritora, respondendo ao pedido dos escritores de “recomendá-los” (textos) aos leitores, delicadamente comenta: “... essa gente jovem talentosa que escreve bem continua tentando preencher o winchester semivazio da memória brasileira, é sinal de que a nova ordem continua ‘Em Fermentação‘. É o que importa”.
Rilke respondeu a Franz Kappus: “Pergunta se os seus versos são bons. Pergunta-o a mim, depois de tê-lo perguntado a outras pessoas. Manda-os a periódicos, compara-os com outras poesias e inquieta-se quando suas tentativas são recusadas por outro redator (ninguém o pode aconselhar ou ajudar)”.
Foi muito feliz a baiana Aninha, escritora e teatróloga, ao abrir o prefácio desta obra lembrando a carta de Rilke. Essa geração de artistas modernos do século XIX que tiveram seus caminhos cruzados, de certa forma, aglutinados ao redor de Salomé, contribuiu definitivamente para o avanço da literatura e da psicanálise contemporânea –Nietzsche (1844); Paul Réé (1849); Freud (1856); Salomé (1861) e Rilke (1875). 
Escolhi o conto de Ana Lúcia Merege, para representar todos os escritores e textos. Descrever sobre todos os textos é impossível. A coletânea é maravilhosa. Especialista em ficção medieval publicou “O caçador” e “O Jogo do Equilíbrio”, além de vários artigos e do ensaio “Os contos de fadas: Origens, história e permanência no mundo moderno”, anima o blog ― A Estante Mágica de Ana www.estantemagica.blogspot.com.

”Contos Perversos 1”, da Coleção Literatura Clandestina, organizado por Elenilson Nascimento nos contempla com a belíssima obra de Ana Lúcia, “A senhora do amor e o herói trapaceiro”. Essa narrativa trata de um roteiro facilmente identificável em dois pontos importantes: a) O vocabulário, nos transporta, sonhando, à uma realidade medieval. b) Trata-se de um texto erótico contado por Belle, uma jovem mulher interna em um convento. Seu interlocutor oculto, Esquerdo, são vozes que determinam suas ações.

O erotismo explorado por uma escritora sempre desperta, entre machistas masculinos ou femininos, a libido dos leitores, que passam a andar, passo a passo, com a autora. Em outros momentos como voyeur observando às travessuras de Belle, quando olhamos pelo buraco da fechadura o olho mágico de ontem o mesmo de hoje, toda a trama. A coragem de criar e escrever sobre relações pessoais, até hoje, gera questionamentos dos mais variáveis. Num passado não muito distante a mulher escrevia e falava com a boca do homem. A inquisição não perdoava.
“Era apenas um jovem moleiro da vizinhança, e não tínhamos trocado mais do que alguns beijos no jardim do convento, mas elas o assustaram tanto com seus gritos e ameaças que ele prometeu casar-se comigo. Tentei explicar que não era necessário, mas ninguém me deu ouvidos, e as irmãs acrescentaram tanto aquilo que tinham visto que meus pais aceitaram o pedido do rapaz.”
O título soa como uma manchete de primeira página de jornal. O conteúdo literário atende religiosamente ao chamado: “Contos Perversos”. Lendo alguns dos textos distraidamente começamos a imaginar a reserva ética, moral e psicológica da paróquia e de cada autor. São, absolutamente, contos perversos. Não cabe uma análise do comportamento desses escritores. Mas, nessa coleção, amigos; só entra se for perverso. Boa leitura... (CONTOS PERVERSOS, Coleção Literatura Clandestina, vol. 1, Org. Elenilson Nascimento, 27 autores, prefácio de Aninha Franco, 178 págs, CBJE – 2006)

* Ventura Picasso é um crítico feroz e leitor compulsivo. Na foto ao lado, você seria capaz de identificar quem é o barbudo da direita, ao lado do então sindicalista Lula da Silva? É o nosso amigo petista Ventura Picasso, com a barba ainda escura. Encontrei a imagem na Biblioteca de Alexandria, ou melhor, no Google, e não resisti em postá-la aqui. É muito legal, sem contar que é histórica. Tenho o maior orgulho de dizer que o Picasso é frequentador deste blog, e deixa seus comentários de vez em quando, apesar de ter negado fazer umas entrevistas pra mim porque é muito metido. Mas gosto muito dele, pois demonstra ser um homem inteligente, coisa não muito comum nesses tempos de alienação, além de ser também um dos pensadores da Academia Araçatubense de Letras. Picasso também escreve no blog Reflexões do Ventura: www.picassoventura.blogspot.com.br Contato:venturapicasso@hotmail.com 

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